domingo, 5 de setembro de 2010

ULTRA-desconhecimento

É frequente desconhecer-me – o que sucede com frequência aos que se conhecem.

Bernardo Soares

Como que uma doença intransmissível que existe em minha alma apenas e que destrói a integridade de meu corpo defronte dos outros e para com eles. Tenho a noção da totalidade existente completamente descontrolada, tudo o que sabia perdi, e não sei mais. O que vejo desperta em mim uma tristeza enorme por já não saber o que é e para que serve – o resultado, em princípio, seria a felicidade enorme em ser uma coisa desconhecida; mas sabendo que já tudo soube, esmoreço. Nada desperta satisfação ou coisa que me valha.
Aprendi vários dos valores da vida no silêncio das coisas; a ignorância a todas elas poupou-me a inúmeras emoções, porém, não me salvaguardando da enorme tristeza de um adeus múltiplo e complexo do mundo. Cheguei, hoje, à conclusão da miséria humana. Já só posso sonhar que sei e, quando acordo, toda a ausência do conhecimento transforma-me no aborto intelectual que o Universo concebeu. Para o Universo não pensar cada corpúsculo de matéria formou uma lei soberana a qualquer decisão; eu, para não poder pensar, sou parte do Universo Todo-grandioso e tão amplo que nem o mais genial espécime humano poderia colocá-lo num plano de pensamento cerebral.

O que escrevo torna toda a existência, a partir de hoje, na massa mais irrisória possível.

O desespero de ter de haver para cumprir leis é um turismo condicionado à concentração de banalidades complexas e perfeitamente tristes. Todos os factos do destino disto e daquilo bate de encontro com minha cabeça – todo um mistério universal que não requer nada senão movimentos deterministas. Sou livre como uma ordinarice de uma outra qualquer rua que não tem nome nem forma nem lugar para ser vista pelos olhos. O que sei de mim não é imitado por ninguém – esqueci-me dos viajantes das gentes banais e de todo o descanso que relembro a Sociedade em deslocação. O que sei é longínquo e tão diferente que, por isso, não deveria existir. Tudo o que fui, talvez dúvidas contempladas em morros de um pensamento sem utilidade, esqueci e vivo sem incómodos por ninguém e por nada. Tudo o que imagino é de uma intensidade incomparável.

O sofrimento em que fico por perder a ilusão é uma vaga morte da minha alma sensível. E sento-me sobre um banco de graça de pedra com fantasias de monumentalismos ao longe, como que palácios meus, que hoje são desertos. Vivo sempre a perda de tudo com um contacto de uma estreiteza fatidicamente final – e estou triste porque sei ser livre num exílio impossível

De burguesas insatisfações.

Rúben De Brito

2 comentários:

  1. Desconhecia esta tua faceta, este teu dom para a escrita! Fiquei agradavelmente surpreendido com tamanha perspicácia e fluidez na escrita! Não desperdices nunca essa tua intrínseca habilidade.. espero acompanhar-te mais vezes :)

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  2. "Aprendi vários dos valores da vida no silêncio das coisas" VENERO !
    parabéns :)

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